25 de setembro de 2010

CAPÍTULO 05 - COMEÇA O DRAMA

_Claro, sem dúvidas!
_ Mandaremos o contrato para assinarem até o fim de semana.
_Esperaremos Marcos.
_Tenha um bom dia. – disse Renan depois de quarenta minutos de reunião com o representante da Construminas.
_Um bom dia pra vocês também. – retornou Marcos.
Renan abriu a porta:
_Eu o acompanho até o estacionamento, tenho um compromisso às oito.
_ Ah!Claro. – entraram no elevador. O olhar de Renan pra mim enquanto a porta se fechava fez com que meu sorriso de “simpático”com o representante se quebrasse. A ponto de ele perceber e torcer uma das sobrancelhas como se perguntasse: o que foi isso?
Fiquei alguns segundos parados na porta olhando para o corredor. As vezes meu olhar se congela em pontos fixos, pontos sem sentido, como o botão do elevador enquanto minha mente trabalha furiosamente consumindo meu cérebro, até que me lembro que ainda estou vivo e volto a me movimentar. Já são quase oito horas. Estou acordado a apenas três horas e meia. A corrida de meia hora, a conversa com uma adolescente, os devaneios no transito, a discussão no trabalho, a reunião de negócios, o que mais podia esperar das outras onze horas do meu dia? (É que eu durmo cedo!)
_Até que foi rápido! – exclamou Rômulo.
_A negociação estava pronta, fomos só reavaliar algumas cláusulas do contrato, estamos procurando o melhor modo de não ficarmos dependentes dessa construtora. Vai ser uma ótima parceria, mas creio que não permanente. Hora de um café?
_Seria ótimo. Você faz hoje?
_A não! Vamos na padaria da esquina, eu pago!
_Renan foi aonde?
_Ele tinha uma reunião de pais e mestres! Uma apresentação da filha na escola, sei lá!
Ele olhou pra mim como se eu não tivesse dito nada.
_Vai demorar uns noventa minutos!
_Beleza!
Rômulo levantou no impulso, puxando as caixas de som com o fone que nunca tira dos ouvidos. Esbarrou na cadeira, tirou os fones, desligou a tela co computador. Eu já estava do lado de fora, esperando o elevador.

_Bom dia Marta!
_Bom dia Dr. Félix!
_Só Félix Marta, já disse!
_Tá bom, “Félix”.
_Eu quero um café e um pão de queijo.
_Eu, hum... o mesmo. Não, dois pães de queijo. – disse Rômulo.
_Levo rapidinho pra vocês!
_Obrigado Marta.
_Zé! – Rômulo as vezes me chama assim – Me fala sobre a Nice! De onde você inventou ela?
_Inventei! Eu não inventei nada.
_Pode dizer cara! Se você gosta de... Como se chama aquela banda?
_Eu não sei, eu não conheço aquela música! Sei que já ouvi em algum lugar, mas não sei quem toca! – essa história já estava me irritando.
_Beleza. Beleza. – disse se virando do balcão.
Sentamos numa mesa perto da porta. Virei-me para a rua, com o objetivo de ver as pessoas, os carros. O movimento da rua, das pessoas me tranqüiliza. Saber que não estamos sozinhos no mundo. Ver as caras de alegria, angústia, sofrimento e medo das outras pessoas nos lembra o quão normal nós somos. Os sons do dia a dia. Estamos sempre cercados de pessoas. Mas esse som, que parecia música pra mim, parecia não satisfazer Rômulo. Ele queria conversar.
_ O Renan me disse que temos uma proposta da “Patriarca” para uma reforma de visão e estrutura nas lojas da ...
_ Rômulo! Rômulo! Deixa pra gente conversar de trabalho outra hora, lá no escritório de preferência. Não precisamos viver nosso trabalho. Dá pra você esquecer o Renan por um instante e apreciar o café. Veja o dia-a-dia dos outros, curta a vista do trânsito pacato de cidade pequena, veja as pessoas.
_ Por falar em pessoas olha aquela mulher saindo do açougue!
Hesitei inicialmente. Tudo que eu não precisava agora era arrumar uma mulher pra atrapalhar minha tranqüilidade. Estou vivendo um momento meu. Prefiro continuar sem pressões. Menos um compromisso. Mas ao olhar para a cara do Rômulo, a curiosidade humana falou mais alto, ele tinha um sorriso babão estampado. Me virei rapidamente e vi um cabelo ruivo esvoaçante refletindo o dourado do sol. Esse cabelo emoldurava uma pele clara, um nariz com sardas, um decote comportado mas chamativo, apesar dos seios não parecerem lá grandes coisas e um olho que, na verdade, não se podia ver, pois estavam protegidos por um enorme óculos escuros. Realmente uma imagem digna de ser vista. Foi então que a trave do encanto caiu dos meus olhos.
_ Ah! É a Laura.
_ Você conhece?
_ Eu a conheci no lançamento de um livro de artes. Ele é a dona do “Relicário”, aquela loja de móveis rústicos e antiguidades. Até comprei algumas coisas lá pra minha casa. Conversamos de vez em quando.
_ Zé, você me surpreende a cada dia. Faz pose de santinho, que nunca sai do seu canto, mas parece que esse santo do pau oco esteve saindo do seu relicário. - O sorriso babão tinha se transformado numa cara de inveja.
_ Como assim?
_ Aposto que você aproveita bem seu fim de semana. Solteiro, essa cara de novo e uma grana no bolso, deve ficar com uma mulher diferente por semana. Ou mais! Até adolescente, essa tal Nice. É subiu no meu conceito!
Tudo não passou de baboseira pros meus ouvidos, meus olhos continuavam a observar a rua. Não mais a Laura, ela já tinha saído do meu campo de visão. Mas a distração me fez falar uma daquelas verdades que os homens costumam omitir para não assustar os colegas.
_ Eu nunca saí com ninguém.
Depois de uns cinco segundos de silêncio Rômulo voltou a falar. Na verdade ele tinha se engasgado com o café na hora que eu falei isso.
_ Você nunca...!
_ O que? Perdi o fio da meada. Sobre o que estamos falando.
_ Você acabou de dizer que nunca saiu com ninguém! – ele disse mais alto do que precisava.
_ Eu disse isso! Não precisa falar tão alto. Calma. Eu nunca saí com ninguém, e daí?
_ Como “e daí?” cara! Você tem o que, uns trinta anos e nunca namorou ou saiu ou transou ou amou ninguém!
_ Não foi isso que eu disse! Eu disse que...
_ Você disse que nunca saiu com ninguém! Eu ouvi bem. Não, espere aí, essa é mais uma mentira. Nice, Laura e agora isso, aposto que é tudo mentira, você ta inventando tudo, nunca conheceu uma Nice ou Laura e já pegou um monte de mulher!
_ Me diga por que eu inventaria uma coisa dessas? Se fosse pra mentir eu mentiria justamente o contrário! Diria que tenho um monte de mulheres atrás de mim e que sou o maior galinha.
_ Faz sentido!
_ Eu não tenho o que esconder de vocês não! São meus únicos amigos. Aliás, não sei se o Renan é meu amigo.
Nesse instante ouvimos uma batidinha no vidro da janela e olhamos assustados . E mais assustados ficamos quando Laura, parada em frente a janela, tirou os óculos, mostrando seus olhos castanhos claro e acenando pra mim. Deu um sorriso e um sinal de que me ligaria.
_ Tá, parece que é verdade mesmo. Mas Você nunca namorou?
_ Não.
_ Nunca saiu com ninguém?
_ Não é bem “nunca”! Já tentei, mas não deu certo.
_ Mas pelo menos levava elas pra sua casa, rolava uns amassos...
_ Não! Já disse! – porque quando um homem encontra alguém que eles consideram diferentes dos homens que eles consideram normal precisam especular tanto. Pior que mulher fofoqueira!
_ Por que isso? Você nunca amou? Seu coração é tão frio assim?
_ Rômulo, é muito mais complicado do que você imagina.
_ O que pode ser complicado no amor? O amor acontece! Acontece com todo mundo, em todas as idades!